terça-feira, 28 de abril de 2015

A IMPORTÂNCIA DA GREVE COMO INSTRUMENTO DA CLASSE TRABALHADORA


             O texto por ora apresentado é uma tentativa de estabelecer diálogo com o ensaio "O usuário e a greve", de Roland Barthes. É também a defesa do instrumento da greve como uma ferramenta fundamental e imprescindível da classe trabalhadora.

            Não deixa de ser também, a apreciação do uso da greve como um instrumento ainda atual. Afinal de contas, boa parte das críticas a ela dirigidas por seus detratores é de que existiriam outras formas de se reivindicarem melhorias das condições de trabalho.

            Feita a devida apresentação, é fundamental caracterizar a greve como um elemento construído de forma coletiva. Ninguém faz greve sozinho, a não ser uma greve de fome. Tirante isso é um expediente não só organizado por um conjunto de indivíduos, como a decisão por instaurar uma greve é também geralmente feita de forma plural, através do voto em assembleias comunitárias.

            Retomando o fio da discussão, o texto de Barthes, o autor aponta a burguesia como responsável por tentar construir uma série de dicotomias a partir da greve. E essa classe dominante erigiu, ou tentou assim estabelecer, uma vítima principal das paralisações: o usuário.

            Sobre o caráter coletivo essencial da greve -  em oposição à lógica de individualizar o usuário como vítima -  assim salientou Barthes: "Com efeito, encontramos aqui um traço constitutivo da mentalidade reacionária, que consiste em dispersar a coletividade em indivíduos e o indivíduo em essências"(BARTHES, 2009, p.137).

            Geralmente os ataques à greve, em especial pela mídia, se dão por uma suposta prejudicação daqueles indivíduos que usam o sistema interrompido. Sejamos francos, esse discurso faz justamente uma falsa polarização. Primeiro porque não necessariamente o "usuário" seria prejudicado. Tomemos o exemplo da educação superior pública: as aulas e demais atividades são geralmente respostas ao término de uma greve. Em um segundo plano ainda podemos advogar que o usuário em última instância seria beneficiado pela melhoria no atendimento advindo das conquistas do movimento.

            Aqui podemos aproveitar o gancho e apresentar um elemento essencial da importância da greve. Boa parte das citadas melhorias é conquistada justamente através da organização da classe trabalhadora. Repiso o termo conquistas, pois afinal não são concessões, mas sim direitos duramente conquistados através de lutas sociais.

            Noutro plano, um discurso muito comum e presente no seio das discussões em torno da necessidade ou não de uma greve giram em torno de pautas e demandas salariais. Reproduzir essa prática seria incorrer exatamente no discurso apresentado pela burguesia. O de que indivíduos somente buscam o seu próprio bem. Como se as escolhas fossem estritamente racionais.

            A opção pela deflagração de uma greve contém elementos muito superiores à mera discussão monetária. São defendidas exatamente melhores condições não somente para aqueles que laboram nas categorias, mas também e de maneira central, com a preocupação que norteia a ampliação da base de usuários atendidos, como também das suas condições.

            Outro ataque comum aos grevistas é a tentativa de retirar a sua identidade de trabalhador, como se fossem ações isoladas de seres que sempre desejam prejudicar algo ou alguém, no caso novamente a figura quase mítica do usuário. Também nesse tocante, Barthes é certeiro ao afirmar que:

Do mesmo modo, todos os funcionários públicos quanto os trabalhadores em geral são abstraídos da massa trabalhadora. como se o estatuto de assalariados desses trabalhadores fosse de algum modo atraído, fixado e depois sublimado na própria superfície de suas funções (BARTHES, 2009, p.198).

            O discurso reacionário não consegue compreender boa parte de tais elementos porque defende tão somente o status quo, ou seja, deseja manter as coisas exatamente como estão. A necessidade imperiosa de trabalhadores entrarem em greve vislumbra um futuro diferente daquele em que vivemos. Onde existe escassez e baixa oferta de serviços de qualidade, são reivindicadas melhores condições.

            A opção pela greve é antes de tudo uma escolha corajosa. Não é tão somente parar atividades e cerrar braços, mas sim mobilizar companheiros. É o ímpeto de identificar que o rumo dos elementos não é satisfatório e apontar uma série de alternativas para construir um amanhã melhor e mais justo. Desses sonhos construídos com base na realidade concreta se tece a tomada das ações necessárias.


Referência bibliográfica:

BARTHES, Roland. "O usuário da greve". In: Mitologias. Rio de Janeiro, Difel, 2009.
 
 
Por Marcio Malta
(professor de Ciência Política da Universidade Federal Fluminense)
 

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